ATA DA VIGÉSIMA NONA SESSÃO SOLENE DA PRIMEIRA SESSÃO LEGISLATIVA ORDINÁRIA DA DÉCIMA TERCEIRA LEGISLATURA, EM 30-8-2001.

 


Aos trinta dias do mês de agosto do ano dois mil e um, reuniu-se, no Plenário Otávio Rocha do Palácio Aloísio Filho, a Câmara Municipal de Porto Alegre. Às dezenove horas e vinte e seis minutos, constatada a existência de quórum, o Senhor Presidente declarou abertos os trabalhos da presente Sessão, destinada a homenagear o transcurso dos quarenta anos da “Campanha da Legalidade”, nos termos do Requerimento nº 050/01 (Processo nº 0934/01), de autoria do Vereador Humberto Goulart. Compuseram a MESA: o Vereador Ervino Besson, 3º Secretário da Câmara Municipal de Porto Alegre, presidindo os trabalhos; o Deputado Estadual Paulo Azeredo, representante da Assembléia Legislativa do Estado do Rio Grande do Sul; o Desembargador Délio Spalding de Almeida Wedy, representante do Tribunal de Justiça do Estado; o Senhor João Verle, Vice-Prefeito Municipal de Porto Alegre, a Senhora Margarete Moraes, Secretária Municipal da Cultura; o Coronel Emílio Neme, ex-Chefe da Casa Militar do Palácio Piratini; o Senhor Christopher Goulart, representante da família do Senhor João Goulart; o Vereador Humberto Goulart, na ocasião, Secretário “ad hoc”. A seguir, o Senhor Presidente convidou a todos para, em pé, ouvirem a execução do Hino Nacional, pela Banda da Brigada Militar, sob a regência do maestro Subtenente Marco Aurélio Schweiz, e, após, concedeu a palavra aos Vereadores que falariam em nome da Casa. O Vereador Humberto Goulart, em nome das Bancadas do PSDB, PSB, PMDB e PL, discorreu acerca da participação de Sua Excelência em episódios ligados à “Campanha da Legalidade, prestando sua homenagem às diversas personalidades que integraram o movimento, especialmente aos Senhores Leonel Brizola, João Goulart e Getúlio Vargas. O Vereador Raul Carrion, em nome da Bancada do PC do B, parabenizou o Vereador Humberto Goulart pela iniciativa de propor a presente solenidade em homenagem ao transcurso dos quarenta anos da “Campanha da Legalidade”, destacando a importância desse episódio para o povo Rio-Grandense e salientando a participação de personalidades históricas no episódio. Na ocasião, o Senhor Presidente registrou a presença do ex-Vereador Pedro Ruas, representante do Deputado Estadual Airton Dipp, Presidente Regional do PDT, e do Senhor André Fortes, Vice-Presidente Regional da Juventude Socialista do PDT. Em prosseguimento, foi dada continuidade às manifestações dos Senhores Vereadores. O Vereador Isaac Ainhorn, em nome da Bancada do PDT, salientou a importância e a contemporaneidade da “Campanha da Legalidade” para o resgate da história do Brasil, relembrando momentos vividos por Sua Excelência durante o evento, como integrante do movimento estudantil. Na ocasião, o Vereador Ervino Besson, presidindo os trabalhos, comunicou que o Deputado Estadual Paulo Azeredo se ausentaria da presente Sessão e, em seguida, convidou o Vereador Isaac Ainhorn a assumir a presidência dos trabalhos da presente Sessão. Após, foi dada continuidade às manifestações dos Senhores Vereadores. O Vereador Estilac Xavier, em nome da Bancada do PT, salientou a justeza da homenagem hoje prestada por este Legislativo ao transcurso dos quarenta anos da “Campanha da Legalidade”, ressaltando que, no entender de Sua Excelência, o Brasil ainda vive hoje a luta pela legalidade e pelo cumprimento da Constituição brasileira em prol da soberania da Nação. O Vereador Pedro Américo Leal, em nome da Bancada do PPB e PFL, procedeu a relato da sua participação em episódio que evitou o combate entre a Companhia de Guarda, comandada por Sua Excelência, e a Companhia da Brigada Militar, por ocasião da deflagração da Campanha da Legalidade, organizada pelo Senhor Leonel Brizola. O Vereador Elói Guimarães, em nome da Bancada do PTB, externou sua satisfação em poder participar da presente homenagem, afirmando ser a “Legalidade” um movimento a favor da soberania popular. Também, destacou acontecimentos marcantes que fizeram parte do movimento, exaltando a participação de personagens do cenário político brasileiro. Em continuidade, o Senhor Presidente convidou a todos para ouvirem a execução de trecho do discurso do ex-Presidente João Goulart, quando de sua chegada em Porto Alegre no dia cinco de setembro de mil novecentos e sessenta e um. Após, o Senhor Presidente concedeu a palavra, respectivamente, ao Coronel Emílio Neme e ao Senhor Christopher Goulart, que destacaram a importância da homenagem hoje prestada pela Câmara Municipal de Porto Alegre, alusiva ao transcurso dos quarenta anos da “Campanha da Legalidade”. A seguir, o Senhor Presidente convidou os presentes para, em pé, ouvirem a execução do Hino da Legalidade e, em seguida, ouvirem a execução do hino Rio-Grandense, pela Banda da Brigada Militar, sob a regência do maestro Subtenente Marco Aurélio Schweiz e, nada mais havendo a tratar, agradeceu a presença de todos e declarou encerrados os trabalhos às vinte e uma horas e vinte e dois minutos, convocando os Senhores Vereadores para a Sessão Ordinária de amanhã, à hora regimental. Os trabalhos foram presididos pelos Vereadores Ervino Besson e Isaac Ainhorn, e secretariados pelo Vereador Humberto Goulart, como Secretário "ad hoc". Do que eu, Humberto Goulart, Secretário "ad hoc", determinei fosse lavrada a presente Ata que, após distribuída em avulsos e aprovada, será assinada pela Senhora 1ª Secretária e pelo Senhor Presidente.

 

 


O SR. PRESIDENTE (Ervino Besson): Estão abertos os trabalhos da presente Sessão Solene, destinada a homenagear os 40 anos da Legalidade, nos termos do Requerimento nº 050/01, de autoria do Ver. Humberto Goulart.

Convidamos para compor a Mesa o Ex.mº Sr. representante da Assembléia Legislativa, Deputado Estadual Paulo Azeredo; Ex.mº Sr. representante do Tribunal de Justiça do Estado, Desembargador Délio Spalding de Almeida Wedy; Vice-Prefeito de Porto Alegre, João Verle; Sr.ª Margarete Moraes, Secretária da Cultura; Coronel Emílio Neme, ex-Chefe da Casa Militar do Palácio Piratini; Sr. representante da família João Goulart, Chistropher Goulart.

Convidamos todos os presentes para, em pé, ouvirmos o Hino Nacional, executado pela Banda de Música da Brigada Militar, regida pelo maestro Subtenente Marco Aurélio Schweiz.

 

(Executa-se o Hino Nacional.)

 

O SR. PRESIDENTE (Ervino Besson): Queremos, neste momento, saudar, de uma forma muito especial, de uma forma muito carinhosa, o Ver. Humberto Goulart, que teve esta brilhante idéia de comemorar, aqui nesta Casa, os 40 anos da Legalidade. Não podemos deixar de saudar também, neste momento, a imprensa, especialmente a RBS, que teve a idéia brilhante de lembrar a história dos 40 anos da Legalidade. Temos acompanhado os vídeos que foram montados pela RBS, quando assistimos, de uma forma muito emocionada, a história da Legalidade.

Nós, trabalhistas de berço, sabíamos uma parte da história, mas não éramos sabedores de tudo o que aconteceu há 40 anos. Portanto, temos de registrar esse acontecimento que a imprensa tem divulgado diariamente, que foi o que representou a história da Legalidade aqui para a nossa Cidade, para o nosso Estado e para o nosso País. Portanto, mais uma vez, registramos aqui o reconhecimento desta Casa por essa sua iniciativa, nobre colega, querido Ver. Humberto Goulart.

O Ver. Humberto Goulart está com a palavra e falará pelas Bancadas do PSDB, PSB, PMDB e PL.

 

O SR. HUMBERTO GOULART: Sr. Presidente e Srs. Vereadores. (Saúda os componentes da Mesa e demais presentes.) Esta é uma noite de homenagens e lembranças. Quero-me reportar aos meus amigos do Bairro Restinga que estão presentes aqui e, em especial, à minha família, à minha mãe, à minha mulher e aos meus irmãos.

Agradeço por todo o trabalho que se passou neste mês. Agradeço aos funcionários do Memorial da Câmara: Fátima, Beth, Carmem e Jorge.

Agradeço aos dedicados funcionários do meu gabinete, à comunidade, aos outros amigos que não citei e aos outros familiares que não mencionei. Como eu disse, esta noite, para mim, é uma noite de homenagens e de lembranças. (Lê.)

“Rio de Janeiro. Passaram-se quarenta anos, mas lembro como se fosse neste agosto no qual vivemos hoje, meu querido e saudoso pai, Tenente Cleber Piegas Goulart - homem comprometido com o humanismo trabalhista - retornou muito cedo, naquela tarde, para casa. Com muita calma, anunciou que deveríamos viajar em seguida, pois passávamos a correr perigo na terra do antinacionalista Carlos Lacerda.

No caminho para Saquarema, praia do litoral Norte do Rio, nos contou que o Presidente Jânio Quadros havia renunciado, em um daqueles seus repentes, e que ele, Cleber, estranhava que o seu sucessor legal, o Vice-Presidente João Goulart, estivesse tão longe e logo na China Comunista.

Ao chegarmos na casa dos amigos que nos acolheriam, corremos para o rádio, mas não havia nenhuma notícia, somente o som de marchas marciais, e não se conseguia telefonar para as famílias Ciulla e Goulart aqui no Rio Grande do Sul. Passadas algumas horas, um radioamador nos dava conta de que o Governador Leonel Brizola comandava a resistência e se formava, por meio do rádio, sempre o rádio, a Cadeia da Legalidade. Contava também que os gaúchos estavam se alistando para formar a milícia que, com a Brigada Militar, lutariam para fazer cumprir a Constituição Brasileira.

Mas e o Exército? Meu pai, fiel colaborador de Jango, dizia que eles não permitiriam a volta do novo Presidente. Havia um certo General Denys.

Mas, e a Igreja? Preferiria a ilegalidade ao perigo que representaria a assunção de João Goulart, que era “comunista”, mas nós sabíamos que Jango era cristão, que era católico!

Em seguida, até os jornais anunciavam que o III Exército, sob o comando do General Machado Lopes, passava a garantir a Legalidade.

Nos meus 14 anos, no romantismo das possibilidades aventureiras, queria vir para Porto Alegre para ser soldado de Brizola, bravata que causou uma exclamação sorridente em meu exemplar pai tenente.

Mal sabia eu, meus amigos, que estaria, hoje, de maneira regimental e eleito por este mesmo bravo povo de Porto Alegre, inaugurando uma mostra das imagens daqueles momentos de glória.

Leonel Brizola e João Goulart nunca souberam o que sempre fizemos, eu e tantas outras pessoas, para manter viva a chama do trabalhismo e a força de seus idealismos: Brizola herói distante e Jango, porque o deixaram morrer no exílio.

A nossa homenagem para o nosso querido líder Leonel Brizola, porque foi corajoso na resistência da Legalidade - a última vitória do Rio Grande do Sul - ao se insurgir contra os desmandos das elites que se reuniam na corte do centro do Brasil. E porque Brizola ainda é corajoso, ao nos apontar o caminho nacionalista em defesa da nossa cobiçada Pátria.

A homenagem ao saudoso líder, Jango Goulart, que sempre soube compor politicamente para evitar a guerra fratricida - aceitou o Parlamentarismo, para ser aceito Presidente, que era - foi obrigado a deixar o seu Brasil amado, mais adiante. As elites, inconformadas, desde 1961, encomendaram em 1964, aos Estados Unidos um golpe que, a exemplo do Vietnã, poderia ter gerado confronto dentro do nosso querido País, dividindo em País do Norte e País do Sul.

A homenagem, também, a João Goulart pela sua coragem - quando Ministro do Trabalho de Vargas – em aumentar o salário mínimo em 100%. Como Vice-Presidente que iria assumir a Presidência, a coragem que teve de voar do exterior frente a possível “Operação Mosquito” que, covardemente, poderia abater seu avião de carreira. Coragem, porque apresentou as reformas de base, ainda hoje tão desejadas. As reformas que libertariam o povo brasileiro, que continua refém dos bancos e das elites, que mantém os Governos, uns que abusam das medidas provisórias, e outros que não fazem nada.

Minha homenagem ao valoroso povo do nosso Estado do Rio Grande do Sul, na confiança de que saibam sempre escolher o lado certo.

Minha homenagem à combativa Bancada do PDT no Senado, na Assembléia Legislativa e na Câmara Federal. Minha homenagem a todas as Bancadas Municipais - que formam o PDT no Brasil - nas pessoas dos Vereadores: Ervino Besson, Isaac Ainhorn, João Bosco Vaz e do nosso Líder, Nereu D’Avila, em nossa Câmara.

Avante, Rio Grande, terra de heróis!

Avante a memória da Legalidade!

Dilamar Machado, que eu citava no início com a possibilidade de estar aqui entre nós hoje e que nos deixou de uma maneira - para mim que inicio na política – muito precoce. Joaquim Felizardo, Paulo César Pereio, Adaucto Vasconcellos, Hamilton Chaves, Carlos Contursi, Antônio Carlos Porto, Ney Fonseca, Alberto André, Assis Hoffman, João Batista Aveline, Lauro Hagemann, Melchíades Stricher Filho, Ony Nogueira, Emílio Neme, Hélio Carlomagno, João Carlos Guaragna, Alarico Pavão - uma mulher - Lara de Lemos, Pedro Flores, Caio Lustosa, Léo Guerreiro, Carlos Bastos, Lucídio Castelo Branco e Índio Vargas.

Uma homenagem para todos os heróis que eu não falei, no nome da figura do meu querido pai, que não está mais entre nós para assistir ao seu filho com mandato popular. Viva o comandante Leonel de Moura Brizola! Saudade do último Presidente trabalhista do Brasil, João Belchior Marques Goulart. Muito obrigado.” (Palmas.)

 

(Não revisto pelo orador.)

 

O SR. PRESIDENTE (Ervino Besson): O Ver. Raul Carrion está com a palavra e falará em nome do PC do B.

 

O SR. RAUL CARRION: Sr. Presidente e Srs. Vereadores. (Saúda os componentes da Mesa e demais presentes.) Cumprimento o Ver. Humberto Goulart pela iniciativa que nos oportuniza tratar de um tema tão importante para o nosso Estado e para a luta do nosso povo. Eu estou com compromissos inadiáveis, - havia explicado para o Vereador e até pedi licença aos demais Vereadores para falar no início - e já me escuso, porque terei que me afastar; mas não podia deixar de estar presente neste momento tão importante em que rememoramos a luta da Legalidade. (Lê.)

“Em primeiro lugar, temos que destacar que esse movimento - que, há quarenta anos homens e mulheres do nosso Estado protagonizaram - teve uma liderança que jogou um papel decisivo que foi, evidentemente, o Governador Leonel de Moura Brizola que, com seu carisma, a sua coragem cívica, a sua determinação, empolgou o povo gaúcho, levantou esse povo e transformou o nosso Estado numa fortaleza inexpugnável contra aquela tentativa de golpe em 1961, que no nosso entender, antecipava o golpe de 1964.

Sem dúvida, os 13 dias da Legalidade - de 25 de agosto, quando Jânio renunciou, a 7 de setembro, quando Jango assumiu como Presidente Parlamentarista – é um daqueles períodos em que os dias valem por anos na consciência dos povos. Caracterizada pelo saudoso Joaquim Felizardo como o “Ultimo Levante Gaúcho”, a Legalidade vincou profundamente o espírito libertário, patriótico e rebelde do povo sul-rio-grandense e contribuiu para a sua conhecida politização.

Naquele momento, com 15 anos, não posso deixar de dar o meu testemunho de quão profundamente repercutiu em mim essa extraordinária experiência que, com toda certeza, tem tudo a ver com a minha trajetória política e ideológica posterior.

Mas quero destacar, na minha fala, aqueles personagens menos conhecidos, operários, trabalhadores, estudantes, soldados, donas de casa que - como que num despertar heróico e massivo - rebelaram-se em todo o Estado, em defesa de uma abstrata ‘Legalidade’ que, na sua intuição representava a perspectiva de um Brasil soberano, democrático e mais justo, ainda hoje por alcançar.

Nesse sentido, acho importante resgatar o Quartel General da Resistência Democrática, sediado no chamado ‘Mata-Borrão’, na esquina da Andrade Neves com a Borges de Medeiros, onde hoje está o ‘Tudo Fácil’. Ali constituiu-se a resistência popular. Ali, sindicalistas, estudantes, intelectuais, comunistas, trabalhistas, socialistas, irmanaram-se no Comitê Central da Resistência Democrática. Organizaram alistamento de milhares de pessoas e semearam, em todo o Estado, 400 Comitês de Resistência Democrática. Ali formaram-se os batalhões operários da Carris, dos marítimos, dos ferroviários, dos universitários, dos bancários, dos artistas, dos intelectuais, das mulheres, das vilas populares, dos secundaristas. Ao todo, ao final desse processo, mais de cem mil gaúchos haviam se alistado nos Comitês de Resistência Democrática.

Dali saía o jornal ‘Resistência’, cuja primeira edição ocorreu no dia 26 de agosto com uma tiragem de 20 mil exemplares. Esse Jornal, no total das suas edições, chegou a 200 mil exemplares. Destaco alguns nomes: no ‘Mata-Borrão’: Fernando Almeida; o ex-Vereador comunista, Elói Martins; o ex-Deputado comunista, Abílio Fernandes; Vítor Douglas Nunes; advogado dos sindicatos trabalhistas, Luiz Heron Araújo e, inclusive, João Amazonas que, nesse momento, presidia o Partido Comunista do Brasil, aqui no Rio Grande do Sul. Formou-se também o Comando Sindical Gaúcho Unificado, onde destacam-se Jorge Campesatto; Ayala; Luiz Vieira; Lauro Hagemann; Ony Nogueira e tantos outros.

Vamos para o encerramento, porque o tempo é implacável. Queremos destacar também a Resistência dos Sargentos da Base Aérea de Gravataí - o heróico Sargento Crispim, que - preso pelos oficiais superiores, que lhe ordenaram que dissesse aos sargentos rebelados que se entregassem - sob pena de ser morto, ele disse o contrário: ‘Independente de qualquer coisa, sigam o movimento e impeçam os aviões de decolarem para bombardear Porto Alegre.’

Cito a Rebelião dos Sargentos de Canoas e o tenente-coronel Alfeu Monteiro, assassinado em 1964, no primeiro dia do Golpe por ter resistido naquele momento. O papel heróico e aguerrido da nossa Brigada Militar; as greves gerais da UEE e da UGES.

Foi essa grande mobilização do povo gaúcho que decidiu a disputa. A decisão do III Exército e do seu Comandante, o general Machado Lopes, no sentido da Legalidade, está - sem dúvida nenhuma - ligada a essa heróica resistência desses anônimos lutadores do nosso povo. Foi a luta do povo, a sua disposição ao sacrifício que fez também com que, lá em Brasília, os generais golpistas optassem pela negociação.

Hoje, que o nosso País está ameaçado de recolonização; que o nosso povo está ameaçado de perder os seus direitos; que as nossas liberdades democráticas também vão sendo restringidas, o exemplo da Legalidade e da força do povo deve servir a todos nós. E o P C do B, neste momento, inclina suas bandeiras de combate em homenagem a este povo heróico; a essas lideranças heróicas que fizeram do Rio Grande do Sul a fortaleza da defesa da democracia, em tão difícil momento. Um abraço da Bancada do P C do B. Muito obrigado.” (Palmas.)

 

(Revisto pelo orador.)

 

O SR. PRESIDENTE (Ervino Besson): Queremos registrar também as presenças do nosso sempre Vereador Pedro Ruas, representando o Deputado Airton Dipp, Presidente Regional do PDT; do André Fortes, Vice-Presidente Regional da Juventude Socialista – PDT. Sejam bem-vindos entre nós.

O Ver. Isaac Ainhorn está com a palavra e falará em nome do PDT.

 

O SR. ISAAC AINHORN: Sr. Presidente e Srs. Vereadores. (Saúda os componentes da Mesa e demais presentes.) A sensibilidade do Ver. Humberto Goulart proporcionou-me a oportunidade de ocupar esta tribuna neste momento, na medida em que ele, como proponente da iniciativa, com certeza poderia também falar em nome do nosso Partido, o Partido Democrático Trabalhista. No entanto, para me oportunizar este momento, de aqui fazer algumas manifestações, ele me deferiu esta honra de estar aqui presente falando em nome da Bancada do Partido Democrático Trabalhista.

V. Ex.ª, Ver. Ervino Besson, ao abrir os trabalhos, mencionou algo extremamente importante e que revela a sua sensibilidade para a contemporaneidade, e importância histórica do evento Legalidade e a comemoração dos seus quarenta anos, que é o resgate da nossa história.

Para compreendermos a nossa atualidade temos de resgatar e ter presente o que aconteceu na nossa história. Há alguns dias, quando comemorávamos mais um aniversário de falecimento do grande Presidente Getúlio Vargas, na presença do Presidente Nacional do nosso Partido, Dr. Leonel Brizola, falávamos da importância da contemporaneidade e da atualidade da Carta Testamento de Getúlio Vargas e da figura do Presidente João Goulart.

Há alguns dias, o Ver. Raul Carrion, aqui desta tribuna, por ocasião do aniversário de morte do Presidente João Goulart, relegou as divergências para o lado e teve a sensibilidade de reconhecer a importância histórica que teve Getúlio Vargas, e a atualidade das suas propostas.

Nós vivemos um momento singular, e refletir sobre a Legalidade, resgatar a sua história é extremamente importante. À medida que o tempo vai passando, algumas coisas começam a ser ditas, e há dificuldade em trazer fatos novos.

O Ver. Raul Carrion, com precisão, lembrou o que o Sr. Cônsul americano na Cidade de Porto Alegre, no Rio Grande do Sul, em seu relatório, revelava e estabelecia na sua análise para a Embaixada Americana, para a CIA, para o Pentágono, que houve quatro momentos no processo da Legalidade, conforme revelação feita, recentemente, desse documento, publicado, na íntegra, pelo jornal Zero Hora. Ele falava do primeiro momento, o momento da mobilização popular. Essa mobilização popular foi decisiva, e nela estavam presentes o movimento sindical e o movimento estudantil. Na mobilização, na ação desses movimentos, estavam presentes as figuras a que V. Ex.ª se referiu, como Álvaro Ayala, Campezzatto e tantas outras.

Eu também gostaria de destacar algumas figuras extremamente importantes do movimento estudantil. Uma delas é a do então Presidente da Federação dos Estudantes Universitários do Rio Grande do Sul - o Dr. João Verle há de se recordar, porque também foi partícipe desse episódio – que é o Fúlvio Celso Petracco.

Eu, Vereador, tinha um ano mais do que V. Ex.ª quando do Movimento da Legalidade; eu tinha 15 anos. E tive a oportunidade de viver esse extraordinário episódio da nossa Cidade, do nosso Estado, do nosso País, só que eu participei dele não dentro do Palácio, porque era um jovem integrante do movimento estudantil e estava na mobilização e na agitação em frente ao Palácio Piratini, no que hoje leva o nome de Largo da Legalidade. Que orgulho, que imagem nós tínhamos de figuras como Emílio Neme, como o Coronel Aquistapace, como Hamilton Chaves, como Carlos Contursi, que eram os nossos grandes condutores sob a grande liderança de Leonel Brizola. Para nós eram nomes emblemáticos e as grandes lideranças daquele momento e daquele movimento e que teve várias etapas.

Há alguns anos, tive a honra de escrever nos 90 anos das memórias do Julinho - Colégio Estadual Júlio de Castilhos - o capítulo corresponde à década de 60. Ali mencionei num entretítulo, como se diz do ponto de vista jornalístico, que a Legalidade começou no Julinho. Era um final de tarde e a renúncia já estava concretizada, era um fato inarredável, e tudo era motivo de manifestação no nosso Colégio Júlio de Castilhos e, aquele era o momento maior para nós, quando fechamos as portas da Escola - e ali quem comandava eram sempre os estudantes - convocamos, o movimento estudantil para uma passeata, naquele momento, em direção ao Centro da Cidade. Dali saímos, no dia 25 de agosto, às 18 horas.

Passamos pela Prefeitura e não tivemos grande acolhida, até porque na Prefeitura não estava um chefe, um homem da vertente popular. Passamos pela Prefeitura e mandaram acalmarmos os nossos ímpetos rebeldes e que aguardássemos os acontecimentos em casa. Resignados, nós subimos em direção ao Palácio Piratini, e recordo-me como hoje, Coronel Neme, quando chegamos, as portas do Palácio estavam abertas, o Palácio Piratini iluminado e, alguns minutos após, o Governador Leonel Brizola desceu aquelas escadarias, nos recebeu e falou dali das escadarias do Palácio Piratini. A partir daquele momento, se instalou o processo do Movimento da Legalidade, ao final da tarde, no anoitecer do dia 25 de agosto. Dali, nós só cessamos com a posse do Presidente João Goulart.

Isso nos proporciona uma reflexão, e eu quero aproveitar essa oportunidade, exatamente, porque estamos fazendo alguns resgates históricos, importantes para pensar alguns elementos.

Quero confessar que, quando o Presidente João Goulart estava no Uruguai, em Montevidéu, já preparando a sua vinda para o Rio Grande, eu era um estudante jovem, e já estávamos ali na parte fronteira do Palácio Piratini, Ver. Estilac Xavier, com um certo sentimento de frustração, porque já se falava no Parlamentarismo e na conciliação. É óbvio, Ver. Raul Carrion, nós não admitiríamos concessões, nós estávamos num levante popular e queríamos a posse do Presidente da República na plenitude das suas prerrogativas constitucionais, dentro do regime presidencialista.

Eu me recordo os passos seguintes, quando o Presidente João Goulart veio para o Rio Grande, quando ele chegava à janela do primeiro andar do Palácio, nós manifestávamos o nosso descontentamento com aquela armação, com a vinda, a imposição, do Parlamentarismo.

Também me recordo de uma figura, o Coronel Cunha, que, de um carrinho do movimento sindical, com o microfone na parte fronteira do Palácio, cobrava do Presidente: “Jango, tu não vais nos deixar! Jango, tu não podes aceitar!” E outras coisas mais fortes.

Passados 40 anos, Secretária Margarete Moraes, fazendo uma reflexão sobre esses passos e esses momentos, tenho a convicção absoluta de que o caminho escolhido pelo Presidente João Goulart - Ver. Índio Vargas, sempre Vereador - foi o correto. Por quê? Porque, na nossa visão, aquilo que se consegue pacificamente em um ano, não cabia naquele momento nos dirigirmos um levante popular em direção à Santa Catarina, Paraná, São Paulo com as conseqüências que não poderíamos saber quais seriam.

Penso, e algumas pessoas hoje ainda dizem, que o quadro era muito equilibrado, mas nós não teríamos volta de um confronto muito forte entre legalistas e golpistas e pessoas que queriam impedir a posse de João Goulart. Não sei o que seria; agora, eu sei que, em um ano, nós restabelecemos na plenitude, o mandato do Presidente João Goulart e que o plebiscito representou uma grande vitória do trabalhismo, e não só dele, mas das forças populares e da democracia, que devolveu ao Presidente João Goulart a plenitude das suas prerrogativas de Presidente da República.

Esse é, na minha opinião, um dos grandes questionamentos: qual seria o caminho se não tivéssemos optado, se resolvêssemos resistir? Conseguiríamos ser vitoriosos, se em um ano nós conseguimos? Se nós perdemos, se as forças populares foram derrotadas em 1964. Se tivéssemos até chegado ao poder em 1961, com certeza - essa é a minha visão, Ver. Raul Carrion - nós teríamos apenas antecipado aquilo que aconteceu em 31 de março, em um ano.

Hoje nós temos consciência, Ver. Índio Vargas, V. Ex.ª sabe muito bem disso, que o que inviabilizou o Presidente João Goulart de continuar no poder, em 1964, em torno das reformas, foi porque as forças populares não se encontravam efetivamente organizadas para impedir o caminho do Golpe Militar. Foi isso que aconteceu. O movimento sindical, o movimento estudantil e o movimento dos trabalhadores rurais não tinham a organização necessária. Nós vimos os fatos de 1964 e toda essa estrutura, e os que são testemunhas daquele período têm consciência de que caiu como um castelo de cartas toda aquela organização das forças populares.

Em 1964, eu ia fazer 18 anos e era Vice-Presidente da União Brasileira de Estudantes Secundários, e vivi de forma plena todo aquele processo. Eu queria deixar aqui esse depoimento!

Essa contra-revolução não começou em 1961 nem em 1964; ela já teve outros momentos desde 1930, quando Getúlio Vargas foi vitorioso na sua célebre Revolução de 1930. Desde 1945, todas as tentativas foram feitas no sentido de arredar os trabalhistas e as forças populares do poder. Isso aconteceu em 1950, quando tentaram impedir a posse do Presidente Getúlio Vargas, sob vários argumentos formais e jurídicos, inviabilizando a sua posse. Posteriormente houve a tragédia do dia 24 de agosto; depois a tentativa de impedir a posse do Presidente Juscelino Kubitschek; depois a Legalidade, quando tentaram impedir a posse do Presidente João Goulart. E, finalmente, atingiram seus objetivos e nós fomos os derrotados, em 1964, por falta de estrutura, de organização das forças populares, para fazer frente às forças das elites dominantes deste País.

Sr. Presidente, gostaria, neste momento, de deixar este registro, e V. Ex.ª também registrou, Ver. Ervino Besson, com muita sensibilidade, o papel - eu diria, mais globalmente - de toda a imprensa rio-grandense: da RBS, da Caldas Júnior, do Jornal do Comércio, da mídia alternativa, que durante todos esses dias vêm registrando e dando espaço ao resgate da história do Movimento da Legalidade. Muito obrigado. (Palmas.)

 

(Não revisto pelo orador.)

 

O SR. PRESIDENTE (Ervino Besson): O Deputado Estadual Paulo Azeredo tem um compromisso em Guaíba e vai-se retirar. Agradecemos a sua presença.

Antes de chamar o próximo orador inscrito, que é o Líder da Bancada do PT, vamos quebrar um pouco o protocolo. Quero aqui, de público, agradecer ao Presidente Fernando Záchia, que tem administrado esta Casa com muita democracia, muita clareza. Foi sua a idéia de dar-nos a oportunidade, Ver. Isaac Ainhorn, Ver. Humberto Goulart, e demais Vereadores e Vereadoras, para que presidíssemos esta Sessão Solene durante uma parte e a outra parte, neste momento, convido o Ver. Isaac Ainhorn para presidir o restante desta Sessão Solene.

Fica aqui o reconhecimento fraterno para com o Ver. Fernando Záchia que nos concedeu a oportunidade de presidirmos esta Sessão, e como tinha um compromisso, deixou um abraço a todos.

 

O SR. PRESIDENTE (Isaac Ainhorn): Tenho a honra, neste momento, de receber a honrosa deferência do Ver. Ervino Besson, integrante da Mesa Diretora desta Casa, para dirigir os trabalhos desta Sessão Solene.

O Ver. Estilac Xavier está com a palavra e falará em nome da Bancada do Partido dos Trabalhadores.

 

O SR. ESTILAC XAVIER: Sr. Presidente e Srs. Vereadores. (Saúda os componentes da Mesa e demais presentes.) Para nós é uma honra, em nome do Partido dos Trabalhadores, falar, no dia de hoje, e compor os atos que relembram os memoráveis feitos de 1961, dirigidos por essa personalidade lendária e invulgar, que se chama Leonel Brizola. Digo isso sem nenhuma conotação partidária, porque sou um dos que acredita, Ver. Isaac Ainhorn, que Leonel Brizola, tal como Getúlio Vargas, são homens da história do Brasil, acima dos Partidos. E quando vimos aqui, vimos também para dar um testemunho, no presente, da reverência e honra que nos dá lembrar que, aqui nesta terra, um Governador, filho desta terra, liderou um movimento que tinha uma força moral intrínseca, que era a manutenção da Constituição, da Legalidade. Essa forma moral fez com que homens, sem armas, fizessem barricadas na Praça da Matriz, na Igreja, no Palácio, convocassem trabalhadores, estudantes, estabelecessem uma cadeia de rádio que transmitiu para o Rio Grande, naquele tempo, convocando e estimulando as pessoas a resistirem, para quê? Para cumprir a Constituição.

Legalidade - ordem interna de qualquer organismo ou ordem interna de qualquer processo. Legalidade. A legalidade da Constituição, a legalidade da vida, a legalidade dos processos de movimentos que estava sendo alterada e que, portanto, movimentou sentimentos e homens para que um Presidente fosse empossado depois da aventureira renúncia do Presidente eleito que havia empolgado o Brasil com a sua pregação. Presidente que, depois de empossado, pela sua posição político-ideológica, foi golpeado, e nós vivemos um período de trevas. Eu não sou um dos que acha que temos de remover, nesse passado, para vinditas. Faz parte de uma história que deve nos fazer melhores hoje, mais dialogadores.

Quero aqui fazer uma citação especial ao então Capitão Pedro Américo Leal que comandava a Companhia de Guardas que, pela sua temperança, também contribuiu para que não houvesse derramamento de sangue, naquela época, tal como, depois, em 1964, as decisões do Presidente João Goulart impediram que o Brasil se deflagrasse em uma guerra civil. São opções da história, difíceis de serem julgadas, pelas circunstâncias, pelas emoções e pelos momentos. Mas a Legalidade que se defendeu naquela época, talvez se faça, hoje, presente para as legalidades que nós temos de defender, inspirados nesses mesmos ideais. Nós temos, agora no Brasil, neste momento, no Norte do nosso País, um território no qual nós, brasileiros, não temos acesso, há 620  quilômetros quadrados, que se chama Centro de Lançamento de Alcântara, que é base de lançamento de foguetes à disposição do império americano. Nenhum de nós pode entrar, nenhum de nós sabe quem entra, nem o Presidente da República, nem o nosso Exército, nem nenhum brasileiro.

Legalidade nas questões que dizem respeito ao cumprimento da Constituição, quando determina que todo cidadão brasileiro tem que ter direito a salário digno, moradia, saúde, educação. Legalidade.

Legalidade quando diz que o nosso patrimônio, que foi construído com o esforço de todos, foi vendido, não para brasileiros com capital privado, mas a grande maioria vendido para capital estrangeiro. Transnacionalizaram, portanto, o nosso patrimônio.

Legalidade, quando nós sabemos que os 53 milhões de brasileiros vivem, hoje, no máximo, com dois dólares por dia, o que dá em torno de 75 reais por mês, no nosso Brasil. São todos elementos de uma legalidade. Em nome disso, Sr. Presidente desta Sessão, é que nós vimos aqui falar para nos somar a esta idéia de manter viva, aqui na nossa terra, e no Brasil, de que este País depende não de um líder tão-somente, não de um Partido tão-somente, mas depende de uma vontade soberana de seu povo, de traçar o seu destino, de tê-lo e conduzi-lo pelas mãos e isso certamente é feito de forma nos embates duros e democráticos, tensionando os limites da construção para que ela possa progredir, mas mantendo as regras que determinam que a convivência entre os homens não pode ser submetida pela força. E que as idéias, as palavras e as mobilizações de emoções são superiores ao movimento de um fuzil, que deve existir, sim, para preservar as nossas fronteiras, para dar garantias às nossas famílias, para que o nosso País não seja invadido como está. O cerco, atualmente, hoje, pelas bases americanas que estão em todo o Continente Latino, a título de combate ao narcotráfico.

Legalidade é impedimento de que a ALCA entre aqui e devaste de vez aquilo que sobra do único País que pode dar sustentação a uma forma independente, soberana de inserção na história dos povos, aqui, na América Latina, penso que é o nosso País, sem nenhum tipo de patriotismo e respeitando todas as nações irmãs da América.

Por isso, nós nos somamos a esses movimentos, aos atos da Caldas Júnior; aos atos da RBS; à amostra fotográfica aqui da Câmara; a esta Sessão Solene, aos atos da Assembléia; aos da Prefeitura Municipal que, liderada pela nossa Secretária Margarete Moraes, fez um Ciclo de Debates com a participação do Coronel Neme, do Avelline, do Sr. Carlos Bastos, do Cheuiche, do Galvani e outros, marcando também a nossa presença nesta construção, que é uma construção histórica do nosso povo.

Eu estou convencido, Ver. Humberto Goulart, de que V.Ex.ª nos proporcionou hoje - com a forma ímpar com que se relaciona nesta Casa, homem que angariou, pela sua atividade laboriosa, a simpatia pela sua crítica séria e responsável, - nos trouxe, hoje, aqui, um momento de reflexão e muito mais, de afirmação, de que o nosso País ainda vive a luta pela legalidade. A legalidade de uma vida digna para todos e para os brasileiros. Muito obrigado. (Palmas.)

 

(Não revisto pelo orador.)

 

O SR. PRESIDENTE (Isaac Ainhorn): O Ver. Pedro Américo Leal está com a palavra e falará em nome das Bancadas do PPB e PFL.

 

O SR. PEDRO AMÉRICO LEAL: Sr. Presidente e Srs. Vereadores. (Saúda os componentes da Mesa e demais presentes.) Meus companheiros, meus assistentes. Muito relutei em ocupar a tribuna, por quê? Porque, até o terceiro dia, eu tinha um pensamento e seguiria com ele. Mas como estas comemorações são feitas pelo meu Vice-Presidente da Comissão de Saúde, ilustre Ver. Humberto Ciulla Goulart e seu pai era um Tenente, eu venho aqui fazer um depoimento.

Vejam bem, há dezesseis anos na Assembléia Legislativa e, há oito anos e tanto na Câmara, sempre quando vou à tribuna para saudar, em qualquer solenidade, trago escrito em respeito àquele que saúdo, mas hoje faço um depoimento e me permitam que divague. Ora, a história, o que será a história? Examinada em que se deram os fatos, e examinada quarenta anos depois, V. Ex.as  hão de convir, se eu contar o ano de 1954, o ano de 1961 e o ano de 1964 de que participei, não por ter valor, mas porque estava, no momento, no lugar errado, talvez! Eu diria que confidenciei ao Cel. Neme, que Mourão, meu primeiro Comandante, quando veio de Juiz de Fora para cá, vinha com tropa que não sabia atirar. Tenho a carta, se quiserem consultar, está à disposição! Não sabiam atirar. Ele vinha com uma tropa em período de adaptação, um mês de instrução, não sabiam atirar.

Mais adiante, o ano de 1964 que, quando recebi aqui o Malan, na madrugada de 31 de março, não o conhecia. Fui, depois, para o Rio e o que vi lá? Castelo Branco se foi num avião teco-teco, num vácuo feito por um avião a jato. Quem era o piloto? O filho do homem que eu recebia dia 31 de março, aqui, em Porto Alegre, embuçado, à paisana, Alfredo Souto Malan, o filho dele, afilhado do Castelo, era o piloto do jato. Eu, inadvertidamente, citei esse incidente, na sua casa, pouco adiante, um silêncio total. Foi um dos maiores fora que eu dei na minha vida. A família ficou em silêncio, porque aquilo representava para ela um terrível momento que não podia entender: o afilhado de Castelo tinha sido o piloto que causou o vácuo que colocou o avião abaixo. Então, vejam, é uma novela - é o seqüestro da filha do Silvio Santos que se deu hoje, e não entendemos.

Mas o depoimento que tenho de fazer é que nós estávamos, aqui no Rio Grande, esperando o Jânio Quadros. Eu era o encarregado de recebê-lo. Há um mês, eu trabalhava como Comandante de uma tropa de choque de pronto emprego, tropa para medidas especiais, para chegada do Presidente que vinha. Ele chegaria em 24 horas, no dia 25 de agosto, e a chegada de Jânio Quadros foi, na verdade, para as cucuias, nunca se deu, e o que se verificou foi aquela movimentação em todo o Estado convulsionado, boquiaberto. Eu, Comandante de tropa, procurava contatos com todas as tropas do Rio Grande do Sul, e ninguém sabia nada do que estava acontecendo. Falava com o IBAI, em São Leopoldo, falava com o 18 RI, falava com a Polícia do Exército, falava e ninguém sabia o que estava ocorrendo: “O que está acontecendo? Eu não sei”. O Exército ficou estatelado, não sabia o que fazer. Esta é a verdade. Eu vivi tudo isso, procurando informações, alguém com mais experiência do que eu.

Naquele tempo, os telefones não eram grampeados, felizmente, procuramos contatos com todos os Comandantes e o Coronel Saraiva, lá do Colégio Militar, também não sabia de nada, cada um movido pelas suas ebulições do coração, mais nada. Quando, lá pelos dias 27 e 28, as coisas não se definiam, isso é verdade, o General Machado Lopes mandou me chamar de madrugada, eram 2 horas da manhã, e nós estávamos prontos, toda a tropa, já tínhamos feito reconhecimento, estávamos em posição de combate - vocês sabem, armamento pronto, munição paga, viaturas cheias, combustível à vontade e em reserva para partir, quando ele me chamou e deu-me a missão, e eu, como disse ao Coronel Emílio Neme, ponderei a ele: mas, General, acho que podemos ocupar Porto Alegre de outra maneira, eu ocupo, pacificamente, as hidráulicas todas, a Companhia de Energia Elétrica, a CRT; há um ano e tanto as famílias nos conhecem, não há problema nenhum; os meus médicos assistem às famílias dessa gente modesta; os enfermeiros também. Fazemos isso há um ano. O Machado Lopes não conhecia o Rio Grande, estava há quatro meses aqui e não conhecia o Rio Grande. Ele era mineiro, e até fazia refeições comigo, na minha Companhia e quase todos os oficiais da Brigada também passavam por lá, jogando e alimentando-se. Era uma ambiente de franca camaradagem. Eu disse: “Estamos às ordens, no Rio Grande do Sul. Porto Alegre acorda sem luz, sem água e sem nada.” Eu queria evitar, na verdade, porque conheço a nossa Brigada Militar, eu era instrutor da Brigada Militar e sabia da força aguerrida que tinha e da amizade que nós tínhamos a essa tropa tradicional que é, até hoje, o milico, ninguém desconhece isso.

Pois bem, lembro-me, perfeitamente, ele pensou muito e foi até à janela que dá acesso, no 4ª andar, à Rua da Praia, naquele trecho, olhando para a Igreja Nossa Senhora das Dores, muito preocupado, bastante preocupado, e nenhum oficial do Estado Maior, o que me causou muita surpresa, também por causa da hora, quase 2 horas da manhã, e ele olhou, com as mãos na japona – a japona tem bolsos transversais - e virou-se para mim e disse: “Capitão, cumpra as suas ordens!” Eu sai para cumprir as ordens e, no elevador, eu disse: “Mas ainda vou avisar a esse homem outra vez.” Não entrei no elevador e voltei ao gabinete do Comando e disse a ele: “General, eu não quero ordem escrita, mas quero informá-lo de que nós vamos encontrar uma Companhia” - o valor da minha Companhia era 220 homens- “todos armados com metralhadora de mão - e que vai haver um choque de características imprevisíveis, porque daqui vai sair todo estopim que vai incendiar o Brasil.” Mas, ele ainda disse: “Cumpra as suas ordens!”

Eu levantei, atravessei - o gabinete do Comando era do lado direito, não é como é hoje, no meio - todo o quarto andar e no meio do quarto andar vinham dois homens, dois civis: Floriano Maia D’Ávila, Procurador do Estado, e Lauro Schuck, Auditor de Guerra do Exército. Eles vinham em direção ao Comando. Ainda cumprimentei o Floriano, porque o Floriano era, comigo, Professor da Escola de Polícia Civil e da Congregação da Escola de Polícia. Nós éramos bem amigos. Cumprimentei-os e eles se foram para o gabinete do Comando. Eu parti para cumprir a missão. Já estava saindo quando os telefones tocaram, e veio a contra-ordem. Eu disse: “Por telefone, eu não a cumpro.” Então, o Capitão Mourão, pára-quedista, pegou o carro preto e se foi para o Quartel General e, em cinco ou seis minutos estava por lá e me deu a ordem, que era do General Antônio Carlos Murici, que sempre me pediu para que dissesse isto. Eu nunca pude escrever isto. O Antônio Carlos Murici é que deu a ordem, por intermédio do seu ajudante de ordem - o Mourão era ajudante de ordem do Murici, não era do Machado Lopes - não sei quem era o ajudante de ordem de Machado Lopes, era um Capitão que não lembro. Ele me deu uma contra-ordem àquela que eu havia recebido antes.

Por isso, meus Senhores, não se deu o choque entre a Cia. de Guarda e a Cia. da Brigada, que estava na Ilha da Pintada, talvez para o grande sucesso de toda a ordem, que foi restaurada aqui, e para benefício de toda a população do Rio Grande.

Este é o depoimento que eu tinha de dar aos senhores. Não é um discurso; é um depoimento. Muito obrigado. (Palmas.)

 

(Não revisto pelo orador.)

 

O SR. PRESIDENTE (Isaac Ainhorn): O Ver. Elói Guimarães está com a palavra e falará em nome do Partido Trabalhista Brasileiro.

 

O SR. ELÓI GUIMARÃES: Sr. Presidente dos trabalhos, Ver. Isaac Ainhorn. Srs. Vereadores. (Saúda os componentes da Mesa e demais presentes.) Sr.ª Lícia Peres, esposa do nosso grande líder, Ver. Glênio Peres; ex-Vereador Índio Vargas; ex-Vereador Pedro Ruas, representando aqui o PDT; o Lahude, o André, da Juventude; o Salim; o Presidente do Montepio dos Funcionários de Porto Alegre, Luís Carlos Mendelski; Ver. Ervino Besson, que presidiu uma parte deste ato; a Banda da Brigada Militar, Senhoras e Senhores.

Como é importante podermos tocar a história. Aqui estamos tocando a história com aqueles que também foram seus intérpretes ou partícipes dessa história, porque afinal, para a história que é secular, quarenta anos é um tempo extremamente curto e, assim, todos esses acontecimentos que, aqui, estamos rememorando dizem que a história é como ela é. Não se lhe modificam seus fatos, seus acontecimentos, seus personagens, seus heroísmos, enfim. Isso é a história, mas é extremamente gratificante podermos tocá-la, senti-la, enfim, como estamos nesta noite, hoje, sentindo a história com depoimentos, inclusive, de um Capitão que teve um papel, embora colocado em outra posição, de extrema significação para o País, para o nosso povo.

A Legalidade, o conteúdo da Legalidade é imenso, é muito grande. Envolve, basicamente, a soberania popular na preservação dos valores que envolvem não só a Legalidade, mas também a ética. Jango, discípulo de Vargas, foi eleito e como tal deveria governar. Vejam que causa magnífica e, quando a causa é boa, verdadeira e corresponde aos anseios da vontade popular, quando ela tem razão, por assim dizer, ela se faz exuberante e vitoriosa.

Portanto, temos que tirar da Legalidade, não só vivenciar os seus momentos, a sua heroicidade, os seus acontecimentos marcantes que tiveram personagens que hoje ainda atuam com vibração e brilho no cenário político brasileiro, com o seu grande líder, que é e que foi o Dr. Leonel Brizola. Está aqui um personagem vivo da história, Coronel Neme que, na articulação com a Brigada Militar, desenvolveu um papel transcendental na afirmação desse princípio de soberania.

Então, é um momento extremamente importante podermos estar tocando a história e convivendo com partícipes desta própria história. E até certo ponto, nós também tivemos, lá distante, muito distante, evidentemente, na nossa singeleza, um pequeno papel nesse processo político-militar que se desenvolveu no nosso País, a Campanha da Legalidade, e temos que continuar a buscar este evento. Tenho para mim que a Legalidade tem a densidade histórica, bélica, política dos grandes acontecimentos da história brasileira, guardadas as proporções, com a Revolução de 1930, com as escaramuças e revoluções gaúchas de 1923, em São Paulo. Enfim, com tantos acontecimentos que marcaram a vida do nosso País, a grandiosidade do nosso País, a Legalidade tem essa densidade. E dela temos que tirar o que ela nos ofereceu, porque ela se faz numa terra de fronteira, numa área que se incorpora ao Brasil não por acidente geográfico, não por manhas diplomáticas, mas sim porque os gaúchos, num determinado momento, fizeram a sua opção pelo Brasil, pela brasilidade. Aí é que se forma essa substância humana e política do gaúcho, numa mistura de soldado, tropeiro e campeiro e vai formando esse verdadeiro caldo espartano cultural, que é o homem do Rio Grande do Sul. É daí que sai o soldado e as grandes lideranças. É dessa verdadeira sementeira que o Rio Grande vem produzindo, ao longo da sua história, é que saem as suas lideranças, os seus soldados, os seus generais, os seus coronéis e a sua brigada.

Então, Chistropher Goulart, discípulo de Vargas, e como tal não teria, na minha opinião, outra alternativa, senão pagar o preço que o seu mestre, o seu inspirador, Getúlio Vargas, também pagou em 1954, porque podendo resistir - e teria disponibilidade para isso, naquela oportunidade - preferiu sucumbir, Ver. Pedro Américo Leal, e não jogar a sua gente, o seu povo, numa guerra fratricida.

Por igual, Jango Goulart não cedeu; essa conceituação não serve. Ele buscou nas circunstâncias possíveis da história encontrar uma saída para que se evitasse derramamento de sangue. Assim mesmo, com essa atitude, aconteceu “1964”. É evidente que, em 1961, as condições objetivas eram muito mais fortes, a meu juízo, do que as de 1964. Poderia Jango ter resistido, mas preferiu ceder. Ceder no sentido de avançar; ceder no sentido de grandeza; ceder no sentido daqueles que têm a visão de que o sacrifício deve ser feito em nome do seu povo e da sua gente.

Portanto, queremos aqui dizer que a legalidade, Cel. Emílio Neme, deve ser para todos nós, para o povo, porque é a história, a legalidade não pertence a este ou aquele Partido, embora tivessem, os Partidos Trabalhistas e outras agremiações, sido os Partidos que a conduziram; mas a legalidade pertence à história, pertence ao nosso povo e não é um acontecimento regional, absolutamente não. A Campanha da Legalidade é um acontecimento nacional, se não transnacional, pela sua densidade e significação. Porque exatamente o seu conteúdo é a soberania, é o respeito à vontade popular, é o respeito à democracia e, em última análise, a esse grande valor que todos devemos preservar. Portanto, a legalidade é uma fonte permanente onde devemos buscar os ensinamentos na condução do nosso Município, do nosso Estado e do nosso País, como exemplo de grandeza, onde a dignidade nunca faltou. Muito obrigado. (Palmas.)

 

(Não revisto pelo orador.)

 

O SR. PRESIDENTE (Isaac Ainhorn): A seguir ouviremos um trecho do discurso do Presidente João Goulart, quando da sua chegada em Porto Alegre, no dia 5 de setembro de 1961.

 

(É colocada a gravação do pronunciamento do Presidente João Goulart.)

 

“Brasileiros do Rio Grande do Sul, eminente Governador do Estado, Engº Leonel Brizola; eminente Dr. Tancredo Neves, DD Presidente do Conselho de Ministros; Ministros Valter Moreira Salles e Gabriel Passos; meus irmãos do Rio Grande do Sul. Emocionado, eu quero agradecer a essa brava e valente Porto Alegre, a extraordinária e calorosa manifestação que recebemos nesta tarde memorável em que, pela primeira vez, graças à bravura e à coragem do Rio Grande, chego a Porto Alegre para falar aos meus irmãos do Rio Grande como Presidente da República. Quero agradecer a todo o povo porto-alegrense, a esta Cidade já conhecida em todo o território nacional como a Capital da Legalidade Democrática da nossa Pátria, a esta Cidade que, nos momentos mais difíceis por que passou o Brasil, soube comportar-se com coragem e com bravura, soube abrir aqui a primeira trincheira da legalidade democrática; soube, enfim, ao lado do povo brasileiro, lutar contra o golpismo e a favor da ordem da lei das nossas instituições democráticas.

Ao ver o povo rio-grandense, passamos a acreditar mais e a ter mais fé no futuro do Brasil, com esse povo bravo e corajoso, com esse povo que, depois daquela luta heróica, saiu dela mais unido e mais fortalecido. O Brasil poderá se alinhar para as grandes reformas que estão sendo exigidas em todos os Estados da nossa Federação, às reformas de base na estrutura social e econômica do País. Estrutura de base, reformas de base, eu vejo escrito nos cartazes modestos que são conduzidos pelos operários, mas que, de há muito tempo, já estão gravadas na consciência do povo brasileiro.

Ainda há pouco, afirmava o Governador do Rio Grande do Sul, esse jovem que soube portar-se como um grande líder nas horas incertas por que viveu a nossa Pátria, esse jovem que soube colocar-se à frente dos primeiros batalhões da legalidade que surgiu no Rio Grande, e, daqui, dirigindo-se a todo o povo brasileiro, conclamando a todos os irmãos brasileiros que iniciou a grande arrancada pela vitória da causa da legalidade em nosso País.” (Palmas.)

 

O SR. PRESIDENTE (Isaac Ainhorn): Tenho a honra de passar a palavra ao Cel. Emílio Neme, ex-Chefe da Casa Militar do Palácio Piratini, na época do Governo de Leonel Brizola.

 

O SR. EMÍLIO NEME: Sr. Presidente, Srs. Vereadores e demais presentes, o meu cordial boa-noite. Peço permissão para não enumerar o nome das autoridades presentes, porque eu costumo dizer que todas as autoridades que temos no Rio Grande do Sul, no Executivo, Legislativo e Judiciário honram as tradições do Rio Grande, pela probidade, honradez e dedicação ao serviço público. Essa é a saudação que faço às autoridades que estão na Mesa.

Antes de falar sobre a Legalidade, ressalto mais três aspectos: primeiro, dizer que o povo gaúcho, principalmente nós que sempre fomos trabalhistas, tem profundo orgulho dessa figura do Ver. Humberto Goulart e do jovem de futuro, continuador também da obra do Jango, o seu neto Cris. Nós temos de pedir para esses dois homens da área pública que sigam, como estão seguindo, o caminho e os ensinamentos de João Goulart.

Em segundo lugar, saúdo a nossa gloriosa Brigada Militar da qual sentei praça em 17 de março de 1944.

Por último, saúdo aquele colega do Exército Nacional que, uma vez por mês, eu saía da Casa Militar e ia na Companhia de Guardas almoçar com ele, que é o meu grande e cordial amigo Cel. Pedro Américo Leal, o qual, em todas as funções que desempenha, honra a nossa Pátria.

Eu procuro fazer a análise da Campanha da Legalidade por ângulos diferentes, porque tudo o que se podia dizer da legalidade, desse grande líder Leonel Brizola, que, até hoje, é um verdadeiro paradigma da nossa Nação, tudo o que se podia dizer já se disse, principalmente, nesta comemoração dos quarenta anos. Eu gostaria, portanto, de ressaltar a colocação da Campanha da Legalidade no complexo do mundo, principalmente em relação ao Pentágono, o complexo industrial militar dos Estados Unidos, que tem um plano para cada país, de maneira a que todas essas economias revertam em benefício da economia dos Estados Unidos. E a legalidade está dentro deste contexto.

Façamos uma análise rápida: 1930 – Getúlio Vargas leva o povo ao poder e ali tivemos memoráveis decisões do Getúlio, a começar pelo voto da mulher, que nos dá, aqui, a presença de uma Lícia Peres, a presença das Vereadoras, a presença da esposa do Goulart. E foi o voto feminino que anexou a mulher à vida social produtiva do nosso País. Foi o Getúlio Vargas quem fez isso. Depois, tivemos o Ministério do Trabalho, a Justiça do Trabalho e tantas outras coisas que o Getúlio fez no primeiro período dele que não era do agrado do Pentágono. Por quê? Porque trazia novos rumos para o Brasil, anexava o nosso País para outros tipos de atividades, em benefício do povo. Aí, então, tivemos a queda de Getúlio, onde ficou provado que um setor militar não o aceitava mais, integrado - parte dele - com o capital internacional, com o Pentágono. Depois, tivemos a volta gloriosa de Getúlio Vargas pelo voto direto, numa consagradora vitória.

Aí, vem um incidente que já vai caracterizando o problema da legalidade, Jango é nomeado Ministro do Trabalho. E um grupo do Exército, talvez só do Exército, não me recordo bem, capitaneado pelo Coronel Golbery, faz o Manifesto dos Coronéis. Como conseqüência, Jango é demitido de Ministro do Trabalho. Vejam a seqüência dos procedimentos do Getúlio e seus seguidores com as repercussões e os fatos acontecidos. Derrubado Jango do Ministério do Trabalho, eles não se satisfazem. Aí então tivemos o suicídio de Getúlio Vargas, por quê? Porque o povo brasileiro ficou dono da Petrobrás. O povo brasileiro ficou dono da Eletrobrás e o povo brasileiro teve na Lei Agamenon Magalhães, Governador de Pernambuco, a restrição da remessa do nosso dinheiro para os Estados Unidos.

Então, aí outro passo contra a independência econômica e a felicidade do nosso povo. Depois vem a chapa Juscelino/Jango. Novamente tiveram que aceitar a entrada de Jango no cenário nacional. Aí tivemos Aragarças, não é Pedro Américo, aparece em Jacaré-a-Canga, uma rebelião da Aeronáutica, por quê? Pela presença principalmente de Jango no cargo de Vice-Presidente da República.

Depois tivemos a eleição de Jânio Quadros de um lado, o Marechal Lott do outro lado. Tivemos Milton Campos, de Minas Gerais, para Vice-Presidente e Jango na chapa do Marechal Lott. E aí o povo brasileiro fez uma salada de frutas: elegeu Jânio Presidente e Jango Vice-Presidente. E, novamente, as forças internacionais se sentiram molestadas, porque estava ali o seguidor de Getúlio Vargas, o Jango, novamente, em destaque na nossa Nação para lutar pelo povo brasileiro.

Aí, vem a legalidade. Eu gosto de citar um fato, porque as histórias da História é que são as partes interessantes. O Jânio Quadros adota políticas de esquerda e políticas de direita: condecora Che Guevara e toma atitudes com Carlos Lacerda. Tivemos a ordem de Jânio Quadros para que as Forças Armadas recepcionassem a Missão Comercial Russa no Aeroporto Militar de Canoas. Então é mais uma atitude para as Forças Armadas, afrontosas, terem que ir lá receberem os comunistas, oficialmente. E lá estavam Generais, Almirantes, Brigadeiros quando, de repente, chega um automóvel, desce um Coronel, conversa no ouvido do General Comandante do Exercito e se retira. Eu tomei uma posição, não é Pedro Américo, para ver o que ia acontecer, o que era aquilo, e aí começaram os Generais, Almirantes, Brigadeiros, todos a se retirarem. Cheguei perto do Governador Brizola e disse: “Governador, olhe em redor!” Ele olhou: “O que é Neme?” “Olha de novo! Onde estão os militares?” Então, nesse momento, ficou claro que já havia algum General falando acima da palavra do Presidente da República que mandou receber e ele, General, mandou que se retirassem.

Aí, o Governador Brizola mandou que eu fizesse um relatório, trajasse civil e lá fui eu para Brasília para levar o relatório ao Presidente Jânio Quadros, porque o Brizola estava preocupado, sempre pela manutenção da democracia, e como o povo brasileiro tinha escolhido o Jânio, ele tinha que lutar pela democracia com o Jânio. Então, cheguei lá, telefonei para o Castelo Branco, - não sei se o Lucídio está aqui, irmão do nosso Castelinho - e ele imediatamente mandou eu ir para o gabinete presidencial. Cheguei lá e fui recebido pelo Presidente, Jânio Quadros, que disse: “Como vai Major?” “Eu vou bem Excelência e V. Excelência como vai?” Lá, por dentro, eu dizia: “o Senhor é que vai mal.” Entreguei o relatório, ele leu e ficou tenso, nervoso, com a face crispada de indignação ao ver que alguém tinha dado uma ordem acima da ordem dele. Ele virou-se para mim e disse: “Major, diga ao Governador que o Presidente está ciente”.

Ali, meus senhores, começou um ato e um fato concreto da legalidade, porque dali até a renúncia foi rápido, foram rápidos os acontecimentos. Aí, Jânio renúncia e sempre falo nesse sentido, que a renúncia de Jânio foi uma tentativa de golpe, porque, sabedor do Manifesto dos Coronéis, que tinham derrubado Jango do Ministério, ele programa uma viagem oficial do Governo Brasileiro à China Comunista e manda quem? Manda o Jango. O Jango chega na China e como é que ele podia dizer: os senhores são comunistas, isso aí não serve para o povo. Atacar o Comunismo numa visita oficial? Não, ao contrário. Ele era obrigado a elogiar a Administração, o Governo da China, e aí, atiçou, mais ainda, aquele grupo do Golbery - pois eles não o aceitaram como Ministro do Trabalho, porque achavam que Jango iria movimentar a massa sindical - como iriam aceitá-lo na Presidência da República, vindo da China, em tese, com algumas palavras elogiosas ao comunismo? Foi nesse momento que se cristalizou o grande problema da legalidade, que era a volta de Jango para assumir o poder.

Foi quando, então, o nosso intrépido, o nosso glorioso governador Leonel Brizola iniciou a Campanha da Legalidade. E, vejam bem, ele não iniciou a Campanha da Legalidade, o movimento a favor de Jango, não! Ele iniciou a favor de Jânio Quadros. Brizola telefonou para a Base Aérea de Cumbica e ofereceu o Rio Grande do Sul, ofereceu as tradições e o heroísmo do povo Gaúcho para que Jânio, aqui, viesse e exercesse a Presidência da República, caso ele estivesse sendo induzido a abandonar o poder. Mas Jânio Quadros se nega a atender ao telefone, agradece por intermédio do Castelo Branco, e disse que não viria. Só aí é que Leonel Brizola dá o segundo passo a favor da democracia, aí sim, a favor do Vice-Presidente, que se chamava João Goulart, nosso conterrâneo, herdeiro de Getúlio Vargas. E Leonel Brizola inicia, então, a Campanha da Legalidade.

Eu tenho dito que Leonel Brizola defenderia e faria o Movimento da Legalidade, mesmo que o Vice-Presidente fosse o Milton Campos, porque a atitude do Brizola era a atitude pela democracia. O Brizola falando comigo, me disse: “Tu estás me achando purista demais?” Eu disse: “Não, eu tenho certeza de que o senhor faria o mesmo pelo Milton Campos”. E aí surgiu esse movimento glorioso que todos os senhores já conhecem, e profundamente debatido. E então não há necessidade de eu repetir os fatos ocorridos.

Quero repetir e ressaltar o valor da Brigada Militar. Quando o General Machado Lopes entra no Palácio Piratini para dizer que o 3º Exército não acataria ordem dos ministros militares que afrontassem a Constituição Federal, nesse momento, o Comandante-Geral da Brigada Militar, o Cel. Diomário Moojen - e é bom os senhores da Banda prestarem atenção - pediu licença ao Governador Brizola para dirigir a palavra ao General Machado Lopes, porque o Brizola havia colocado a Brigada Militar já sob o comando do General Machado Lopes e as palavras dele exprimiram bem esse espírito da Brigada Militar, quando ele disse: “Sr. General Machado Lopes, eu reivindico para a minha tropa da Brigada Militar o ponto mais difícil do combate que se aproxima. Dê para a Brigada Militar exatamente o ponto de mais intenso combate que poderá ocorrer”. Esse foi o pronunciamento do nosso Coronel, Comandante-Geral da Brigada Militar.

Quero ressaltar, também, tudo que a Brigada fez na Campanha da Legalidade. O próprio Governador Brizola deu uma declaração sobre as ordens que a tropa recebeu para proteger a Rádio Guaíba para que ele pudesse se dirigir ao povo brasileiro. “Morrer e não entregar”, essa era a ordem que a Brigada Militar tinha. Até as lanchas do Corpo de Bombeiros foram armadas e se dirigiram para as imediações da torre da Radio Guaíba para participar da defesa. Felizmente, o meu amigo, Coronel Pedro Américo Leal, não concretizou o ataque de suas tropas contra a Brigada Militar, porque muita gente morreria, não é Cel. Pedro Américo Leal?

Então, temos que ressaltar isso como uma tentativa do Jânio Quadros de fazer um golpe militar. E, agora, o neto dele, numa reportagem – se não me engano - ontem, na Folha de São Paulo, está abrindo a verdade. A verdade que ele nunca quis comentar, que, de fato, o avô dele tinha aquelas pretensões. Que seu ato se tornaria num golpe para que tivesse mais autoridade e não tivesse ninguém contrariando ele.

Mas por que Jânio não conseguiu o seu intento? Porque ele tinha perdido a confiança dos ministros militares. Eles, os militares, não podiam mais confiar num homem que condecorava Che Guevara e mandava as Forças Armadas receber os comunistas no aeroporto. E, na certa, eles sabiam de outras coisas do Jânio. Entram em cena os ministros militares, defenestraram o Jânio e tentaram impedir a posse do Jango, por intermédio de uma outra escolha, de um outro Presidente.

Então, a Legalidade deve ser inserida nesse problema mundial, que o Governo que tenta a liberdade de seu povo é um Governo que fica sob às vistas do poderio do Pentágono. Essa é a grande realidade. É o sofrimento do povo brasileiro, que nunca consegue chegar na essência, no centro, do poder para trabalhar e produzir a felicidade do povo brasileiro.

Eu prefiro não falar nos outros aspectos da Legalidade, porque são profundamente conhecidos. Eu gostaria, sim, de apresentar para os historiadores do futuro, que comecem, desde agora, a analisarem a Legalidade dentro do contexto do Pentágono.

E analisem, que a atitude de Jânio Quadros nada mais era do que a tentativa de um golpe. Muito obrigado.

 

(Não revisto pelo orador.)

 

O SR. PRESIDENTE (Ervino Besson): O Sr. Chistopher Goulart, neto do ex-Presidente João Goulart, está com a palavra.

 

O SR. CHISTOPHER GOULART: Sr. Presidente Ver. Ervino Besson, gostaria de cumprimentar a todas as autoridades aqui presentes na pessoa do proponente desta Sessão Solene, Ver. Humberto Goulart, que tanto se preocupou em explanar e trazer à tona esta página marcante da História, e ao Presidente da Casa, Ver. Fernando Záchia. (Lê.)

“A mim cabe, em nome de minha família, colocar alguns pontos de vista sobre o evento da Legalidade, que comemora quarenta anos e teve como motivo principal o Presidente João Goulart. Quando parto desse princípio, o faço porque, naturalmente, a Campanha da Legalidade girou em torno de sua posse legítima, ameaçada pelas forças conservadoras e ditatoriais, que não viam interesse em permitir que Jango assumisse o cargo, que a Constituição lhe garantia.

A ameaça constante que Jango representou em seu governo - para as elites - por assumir as reformas de base e a independência econômica nacional, que certamente modificariam a realidade do país, começava a dar fortes indícios, em 1961, de que o domínio norte-americano sobre o mundo - propagado pela guerra fria - não teria espaço no Brasil de João Goulart.

A Legalidade, liderada por Brizola, surge neste exato momento de conflito de interesses, com a finalidade de estabelecer a ordem constitucional e resistir a um possível golpe que se anunciava. Assim sendo, o povo gaúcho assumiu a causa e saiu às ruas para dar a resposta aos golpistas. O desfecho desta história já é conhecido dos senhores e senhoras.

A posse de Jango, no entanto, só seria efetivada após ter o Congresso, em tumultuada reunião, reduzido, sob pressão, os poderes constitucionais do Presidente da República. Por isso, quero-me deter na decisão tomada pelo Presidente em não acatar o ímpeto revolucionário de Leonel Brizola, que pregava a resistência a qualquer custo. Jango soube interpretar, com a sensibilidade de poucos, o contexto político que se apresentava, agindo de modo prudente e responsável, evitando, assim, uma guerra entre irmãos brasileiros, o que para ele, na sua integridade, seria a pior das guerras. Adotando, então o improvisado Regime Parlamentarista, que logo se mostraria inviável diante das realidades nacionais.

O Parlamentarismo acabou sendo repudiado pela vontade popular, manifestada em memorável plebiscito, quando a presença de João Goulart na Presidência foi, mais uma vez, consagrada.

Muitos foram os atos e inúmeras as iniciativas do Governo Goulart no sentido de encaminhar o País para uma verdadeira democracia social, promovendo e estimulando reformas, dentro de um clima de plena liberdade de opinião e amplo debate político. Com isso provocou desesperadas reações de parte dos grandes interesses econômicos, quer no plano nacional, quer no plano internacional.

Se me estendo neste breve comentário da atuação política de Jango, é exatamente para justificar sua decisão, acertada, de não se voltar para o lado das armas, voltando-se tão-somente para o plano combativo de suas idéias. Para o Presidente, as armas não deviam falar. A verdadeira guerra travada por ele foi a guerra ideológica da soberania nacional, confrontando-se com o imperialismo norte-americano e com os grandes detentores do poder econômico, com a finalidade exclusiva de outorgar melhores condições à grande maioria dos brasileiros.

E a resposta ao seu verdadeiro e coerente ato de coragem veio com a sua morte no exílio. O Presidente jamais colocou a vida e qualquer brasileiro à frente da sua.

Por isso, quando se fala em Legalidade, nós, gaúchos, temos igualmente a obrigação de destacar o papel fundamental do, também gaúcho, Jango. Assim como destacamos a vibrante atuação do Governador Brizola, pois ambos tiveram destaque. Brizola, por demonstrar a coragem de combate, e João Goulart, por demonstrar a coragem estratégica, dignas de verdadeiros estadistas.

Quero agradecer a todos pela atenção e pela presença nesta homenagem aos quarenta anos da Campanha da Legalidade, que mostrou, ao Brasil, que o nosso Estado se rege por sólidos princípios democráticos e que jamais aceitará imposições arbitrárias de ocasiões que não convergem com nossa grandeza. Meu muito obrigado... E que as armas não falem!” (Palmas.)

 

(Não revisto pelo orador.)

 

O SR. PRESIDENTE (Ervino Besson): Convidamos a todos para, em pé, ouvir a execução do Hino da Legalidade pela Banda da Brigada Militar.

 

(É executado o Hino da Legalidade.)

 

O SR. PRESIDENTE (Ervino Besson): A seguir, ouviremos a execução do Hino Rio-Grandense pela Banda da Brigada Militar, regida pelo Maestro Subtenente Marco Aurélio Schweiz.

 

(É executado o Hino Rio-Grandense pela Banda de Música da Brigada Militar.)

 

O SR. PRESIDENTE (Ervino Besson): Agradecendo a presença de todos, damos por encerrados os trabalhos da presente Sessão Solene.

 

(Encerra-se a Sessão às 21h22min.)

 

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